ZOO

Passei todo o dia sem dizer uma única palavra. Limitei-me a caminhar lentamente numa linha de asfalto à beira-mar. Só agora me apercebo disso, quando finalmente chego ao Zoo de betão. Todo o Zoo é construído com esse composto: o espaço e os seus habitantes. Há neste lugar uma enorme variedade de espécies, as quais observo durante algum tempo com a minúcia de um oftalmologista. Posso assim intitular-me Zootecnista. Tenho até um lugar cativo neste espaço, o qual escolhi por ser o único ângulo em que consigo ver todos os habitantes e em que a minha imagem não me é devolvida por nenhum espelho (e estes multiplicam-se por aqui!). Este ofício de observador tem, em mim, um efeito paradoxal. Esqueço-me de mim. É extraordinário (quase sublime!) poder ver todas estas espécies juntas no mesmo espaço, assistir à forma como se comportam, como se misturam e se parecem cada vez mais com o seu habitat artificial. Lembro-me de mim, e logo este prazer se transforma em temor quando me ponho a tentar descobrir a qual das espécies pertenço. Começo assim a considerar seriamente a hipótese de também eu pertencer a este Zoo.