E PESAVAM-LHE OS OLHOS COM O SONO DOS OUTROS


A serenidade é uma almofada asfixiante onde estendemos o nosso olhar e nos debruçamos sobre o tempo das cidades antigas que nos sussurram ao fundo de costas voltadas para os outros

São espectros
Uma promessa, todas
Escritas, esquecidas
Escrevo “terra” e o olhar desenha-se no avesso de um guardanapo roto onde espreito para te guardar
Digo “tempo” e perguntas: Onde é que eu te deixei na noite em que as estrelas se apagaram uma a uma no teu rosto? Onde ouvimos nós os ecos do que esquecemos?
E dizes “onde” com a corrosiva acidez de um gesto imperativo
“Onde” – Onde ficaram as palavras que dissémos, insolúveis?
Ouço – Tudo – Ouço – Tudo – Ouço – Tudo – e vou-te aniquilando até ver o que resta
À procura dos resquícios de uma acção violenta
Ouço – Tudo – Ouço – Tudo – Ouço – Tudo
E o caos desenha-se
 Nas paredes das nossas cidades novas e já não sabemos se é de dia ou de noite, se vai ser sempre assim ou de outra maneira
e a angústia é uma lágrima seca no extremo da tua face
o horror o intermédio de um apocalipse interrompido

uma destruição incompleta na curva de um braço estendido
sobre o teu ventre gestado